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O amor no Banquete de Platão

Tempo de leitura 9 min.

Oi Gente

Quero dividir aqui com você um pouco sobre essa maravilhosa obra de Platão.

Gosto de ler, estudar e pesquisar sobre a mitologia grega e como pensavam e viviam o povo daquela época, por entender que nós, ocidentais, tivemos muita influencia desses pensamentos e ensinamentos que vão sendo transmitidos de geração em geração.

É da civilização da Grécia Antiga, por exemplo, que veio a democracia, o teatro e a filosofia para citar alguns exemplos.

Por acreditar plenamente que somente o amor é capaz de melhorar as relações humanas, tão necessárias para todos nós seres humanos, que resolvi reler esse lindo texto de Platão – o Banquete – onde o amor é refletido com alguns intelectuais da Grécia Antiga.

Platão viveu entre os anos de 428 a.c a 348 a.c. e essa obra foi escrita por ele. Vale lembrar que o seu mestre e amigo foi Sócrates e a maioria dos textos de Platão foram escritos baseados nos diálogos de Sócrates. Esse famoso texto, o Banquete, supõe-se que foi escrito entre 385 a 380 a.C.

O Banquete

Apesar de Platão ter escrito sobre o Banquete, também denominado como Sympósio, q ele não esteve nesse encontro. Foi através da narração de um dos presentes nesse banquete que Platão escreveu esse lindo texto.

O que era esse Sympósio?

Em algumas casas gregas, havia um cômodo construído especificamente para que houvesse a cerimônia do sympósio ou simpósio. Esse cômodo era um tipo de quarto para os homens, chamado de Andron . Andron era para os homens, e gineceu era um cômodo destinado às jovens donzelas.

Ali nesse cômodo Andron, os homens (os simposistas) se deitavam sobre grandes sofás, nos quais geralmente cabiam duas pessoas, sendo o lugar à direita reservado ao simposista mais velho. “Em uma disposição circular, com uma mesa no centro, eles conversavam e bebiam. Mais que uma simples festa regada a vinho, o simpósio constituía parte importantíssima do mundo grego, já que ali eram tratados temas importantes da vida pública, assim como questões filosóficas e religiosas”. Eleuteria p.73

Apolodoro, acima, era um filósofo e gramático grego e foi ele quem narrou o que aconteceu no Banquete para Platão.

Mas, pelo fato de Sócrates, seu mestre, estar presente nesse banquete, foi Platão quem escreveu sobre esse importante encontro entre vários intelectuais da cultura grega.

Onde foi realizado esse encontro e quem Participou?

Aristófenes, o comediante

Esse encontro foi realizado na casa de Agatão, que era um poeta trágico de Atenas.

Nesse banquete estavam presentes:

Agatão, dono da casa e recém premiado em um concurso;

Aristódemo, discípulo e amigo de Sócrates;

Pausânias, sofista e amante de Agatão;

Eriximaco, médico;

Fedro, um jovem aristocrata e retórico;

Aristófanes, comediante que gostava de ridicularizar Sócrates;

Alcibíades, político;

Sócrates, filósofo e o mais importante convidado

No dia anterior, Agatão tinha vencido um concurso de tragédias e eles ja haviam participado de uma festa e bebido muito por lá. Sendo assim, o médico Erixímaco sugeriu:

“Uma bela ocasião seria para nós, ao que parece – continuou Erixímaco – para mim, para Aristodemo, Fedro e os outros, se vós os mais capazes de beber desistisse agora; nós, com efeito, somos sempre incapazes; quanto a Sócrates, eu o excetuo do que digo, que é ele capaz de ambas as coisas e se contentará com o que quer que fizermos. Ora, como nenhum dos presentes parece disposto a beber muito vinho, talvez, se a respeito do que é a embriaguez eu dissesse o que ela é, seria menos desagradável. Pois para mim eis uma evidência que me veio da prática da medicina: é esse um mal terrível para os homens, a embriaguez; e nem eu próprio desejaria beber muito nem a outro eu o aconselharia, sobretudo a quem está com ressaca da véspera.

Após decidirem por não beber tanto nessa noite, resolveram que iriam falar e refletir entre eles sobre o amor e o belo e falar sobre Eros, um grande arqueiro, o deus do amor.

O inicio dos discursos

Após todos concordarem com o tema a ser debatido naquele encontro, os discursos foram sendo falados, um após o outro.

Abaixo, um pequeno resumo sobre o que cada participante falou sobre o amor.

Fedro

Fedro vê o amor como um deus e quem ama se torna divino e ele acredita que quem ama se sacrifica pelo objeto amado. Um exemplo de amor, na mitologia grega, foi Orfeu o qual desceu até Ades, os infernos, para resgatar a sua amada Euridece e acabou sendo destruído por lá, pois ele pediu para que ela não olhasse para trás até sair do lugar e ela desobedeceu e, assim, Orfeu foi despedaçado.

“(,,,) o Amor é dos deuses o mais antigo, o mais honrado e o mais poderoso para a aquisição da virtude e da felicidade entre os homens, tanto em sua vida como após sua morte”. Fedro

Pausânias

O segundo a proferir seu discurso foi Pausânias, onde diz que o amor nem tudo é só beleza.

Pausânias (foto acima) dizia que tinha dois tipos de amor, um pela alma que seria o amor belo e outro pelo corpo que seria o feio.

“(…) beber, cantar, conversar, nada disso em si é belo, mas é na ação, na maneira
como é feito, que resulta tal; o que é belo e corretamente feito fica belo, o que não o é fica feio. Assim é que o amar e o Amor não é todo ele belo e digno de ser louvado, mas apenas o que leva a amar belamente.
” Pausanias

Enfim, Pausânias faz uma explicação dualista do Amor, onde Eros é dividido entre o o divino e o real e entre o bem e o mal. Então, a palavra é passada para o médico Eriximáco.

Eriximáco

O médico Eriximáco disse que todos os seres são movidos por Eros (o deus do amor, como se fosse uma força cósmica) tudo é atravessado pela força do amor, bem como a medicina que é erótica também, porque tem a força dos contrários.

“É com efeito a medicina, para falar em resumo, a ciência dos fenômenos de amor, próprios ao corpo, no que se refere à repleção e à evacuação, e o que nestes fenômenos reconhece o belo amor e o feio é o melhor médico; igualmente, aquele que faz com que eles se transformem, de modo a que se adquira um em vez do outro, e que sabe tanto suscitar amor onde não há mas deve haver, como eliminar quando há, seria um bom profissional”. Eriximáco

O amor, no discurso médico, provavelmente serviria como um remédio. É como se o amor e o discurso amoroso pudesse ser como a arte de cura. Como se Eriximáco dissesse que a arte de amar deve ser parecida com a arte médica, onde o paciente seria o amante. O discurso amoroso oferecido na dose certa para o amante seria como a medida certa do amor.

Aristófenes

Aristófenes, na sua vez, contou um mito sobre o amor, na linguagem metafísica. “Metafísica é uma das disciplinas fundamentais da filosofia que examina a natureza fundamental da realidade, incluindo a relação entre mente e matéria, entre substância e atributo e entre necessidade e possibilidade”.

Aristófenes em seu discurso resolve primeiramente definir a natureza humana. Ele sairá do discurso de amor de Eriximáco e vai sair da linguagem médica para uma linguagem metafísica.

Ele fala que a natureza outrora não era a mesma que a de agora, mas sim diferente. Ele usará de um mito do Andrógeno para entender a natureza humana.

Um resumo do mito do Andrógeno

Segundo Aristófenes, ele nos diz que no princípio de tudo haviam três gêneros: o feminino, o masculino e o andrógeno e que os homens eram duplos, tendo duas cabeças, quatro pernas, quatro braços e que esses três gêneros “Os três gêneros representavam a forma completa da humanidade, sendo o masculino a junção de homem + homem, originando-se do sol, o feminino seria a junção da mulher + mulher, originando-se da terra e o andrógino, seria a junção de homem + mulher, originando-se da lua”.

Esses seres, tentaram desafiar Zeus, o grande deus da Mitologia e outros deuses subindo aos céus e por isso tiveram sua punição que foi o enfraquecimento da espécie. Assim, cada um dos gêneros foi dividido ao meio, onde antes tinha um agora ficará sendo dois. “(…) nossa antiga natureza era assim e nós éramos um todo; é portanto ao desejo e procura do todo que dá o nome de amor”.

Depois disso, essas metades fica o tempo todo buscando a sua outra metade. Aqui Eros seria esse impulso em busca de essa nossa outra metade, podendo ela ser masculino com masculino, feminino com feminino e masculino com feminino.

Talvez, podemos pensar que desse mito que vem o que escutamos até hoje em nossa cultura sobre o fato do amor estar sempre a procura da sua metade, para que possa se tornar um só. “O desejo desse todo e o empenho em restabelecê-lo é o que denominamos amor”

Assim, somos seres carentes e divididos sempre a procura de algo faltante. A seguir, é a vez de Agatão, o Anfitrião.

Agatão

Para Agatão, de todos os deuses o mais feliz é Eros o deus do Amor, por ser o melhor e o mais belo.

O amor, também, é para os outros a causa de outros tantos bens e é o amor que produz paz entre os homens, bonança no mar, repouso tranquilo dos ventos e sono na dor.

O amor? “É ele que nos tira o sentimento de estranheza e nos enche de familiaridade, promovendo todas as reuniões desse tipo, para mutuamente nos encontrarmos, tornando-se nosso guia nas festas, nos coros, nos sacrifícios; incutindo brandura e excluindo rudeza; pródigo do bem-querer e incapaz de mal-querer; propício e bom; contemplado pelos sábios e admirado pelos deuses; invejado pelos desafortunados e conquistado pelos afortunados; do luxo, do requinte, do brilho, das graças, do ardor e da paixão, no teor da expressão, piloto e combatente, protetor e salvador supremo, adorno de todos os deuses e homens, guia belíssimo e excelente, que todo homem deve seguir, celebrando-o em belos hinos, e compartilhando do canto com ele encanta o pensamento de todos os deuses e homens”. p. 16

Acredita que a força de Eros ninguém é capaz de vencê-la, assim como destino. A flecha de Eros pode penetrar a qualquer momento na alma de alguém sem pedir licença. Eros e o Destino não pede licença a ninguém, pode atingir os humanos, assim como os deuses.

Sócrates então começa seu diálogo sobre Eros

No discurso de Sócrates ele vai falando do amor e questionando os demais presentes. Veja a seguir algumas colocações de Sócrates:

“Não é isso então amar o que ainda não está à mão nem se tem, o querer que, para
o futuro, seja isso que se tem conservado consigo e presente?”
p. 18

“Esse então, como qualquer outro que deseja, deseja o que não está a mão nem consigo, o que não tem, o que não é ele próprio e o de que é carente; tais são mais ou menos as coisas de que há desejo e amor, não é?”. P. 18

Sócrates vai falar sobre o amor embasado, primeiramente, no que ele havia um dia aprendido com uma certa senhora chamada Diotina, sacerdotisa e filósofa grega, sobre os assuntos do amor.

Segundo Diotina, Eros não era um deus e sim uma divindade, algo intermediário entre os homens e os deuses, filho de Poros(astucia) e Penia(a carencia, deusa da pobreza). Eros era astuto como seu pai e carente, pobre como sua mãe e assim ele vai buscar sempre algo para preencher essa carência e na busca de plenitude, ele vai colocar nos humanos um desejo. Que desejo?

É o desejo de imortalidade “O desejo de imortalidade tem dois vetores: a imortalidade do ponto de vista físico que é quando, por exemplo, um casal tem seus filhos e geram uma imagem de imortalidade que são seus filhos, mas que também são mortais e outro impulso de imortalidade é o desejo do conhecimento”.

“Eis por que eu afirmo que deve todo homem honrar o Amor, e que eu próprio prezo o que lhe concerne e particularmente o cultivo, e aos outros exorto, e agora e sempre elogio o poder e a virilidade do Amor na medida em que sou capaz.”

Assim, para Platão/Sócrates, o amor é o nosso desejo de sermos eternos e Eros é amor pela beleza e sabedoria.

Eros, também, é a busca da beleza. A busca pelo belo, a procura dos corpos belos, corpos bonitos. A busca da beleza começa pelos corpos, vai para a beleza da alma, a beleza das virtudes, a beleza das leis, até chegar ao próprio belo.

Nessa busca, da verdadeira beleza, o caminho é incessante. O desejo de conhecimento é algo que está em nós. Assim, Eros é o amor pela beleza e o conhecimento.

Sócrates, então, vai dizer que o amor está em outro lugar, ele vai dizer que a ideia do belo vai ser acessada, de acordo com a subjetividade de cada um.

Já quase no final do banquete, chega Alcebíades, um dos jovens mais belos de Atenas, político e militar. Apesar de estar bêbado ele faz declarações em uma demanda do amor à Sócrates. Ele quer ser amado por Sócrates.

Nessa demanda de Alcebíades por amor de Sócrates faz nos pensar que, diante da demanda de amor em busca da satisfação, e quando essa não é correspondida gerando a falta é ai que o desejo se instala. A falta é que faz o desejar, pois não se deseja o que já se tem.

Nesse movimento e busca constante na tentativa de lidar com essa falta fundante do ser humano é que o amor pode se apresentar como uma solução, oferecendo alguns momentos ilusórios de “relação mútua recíproca, velando o desencontro inerente ao amor, e é este desencontro que mantém o desejo suspenso, a promessa de uma satisfação adiada, nunca atingida. O caráter trágico e cômico do amor: a busca do outro como pânico da falta e o des(encontro) com o outro que o reassinala“. pg. 87

Enfim gente, esse texto é muito lindo pois faz nos pensar sobre o amor, as formas de amar e de como ele se faz necessário, principalmente, nos tempos atuais entre as relações de nós seres humanos.

Referências:

https://repositorio.ufc.br/bitstream/riufc/51468/1/2020_art_lmbrmenezes.pdf

https://pt.wikipedia.org/wiki/Metaf%C3%ADsica

https://repositorio.ufc.br/bitstream/riufc/51468/1/2020_art_lmbrmenezes.pdf

https://periodicos.unb.br/index.php/archai/article/view/8350/6912

Mauricio Marsola, Amor, Conhecimento e Beleza – Casa do Saber – Canal no Youtube.

https://periodicos.ufms.br/index.php/reveleu/article/view/13103/9650

Costa, Geisa – Platão e Lacan: O amor entre a Completude e a Falta

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